Gatos exigem cuidados e manejos que respeitem suas características específicas

É uma realidade preocupante que os tutores de gatos busquem ajuda profissional e orientação com muito menos frequência do que os tutores de cães. Essa resistência pode ser explicada, em grande parte, pela falta de compreensão sobre o comportamento natural dos felinos e pela adoção de práticas inadequadas de contenção, o que leva a um manejo incorreto e a experiências traumáticas, tanto para os gatos quanto para seus tutores.
Os proprietários também enfrentam dificuldades em transportar os gatos até a clínica e lidar com o medo dos felinos durante a consulta, o que contribui para a menor frequência de visitas ao médico-veterinário. Essa falta de preparação adequada, pode causar estresse nos gatos, resultando em medo ou agressividade relacionada ao temor. Estudos mostram que alterações fisiológicas importantes são observadas em gatos muito estressados, podendo dificultar a identificação de alterações comportamentais verdadeiras ou não, resultando em diagnósticos errados com insucesso dos tratamentos instituídos.
A especialidade Medicina Felina tem crescido muito e demonstrado cada vez mais que os gatos são uma espécie muito diferente dos cães, exigindo cuidados e manejos que respeitem suas características específicas. Com isso em mente, a American Association of Feline Practitioners (AAFP) criou em 2012 o programa Cat Friendly Practice, uma iniciativa global voltada para melhorar o atendimento aos gatos domésticos. Esse programa busca criar um ambiente mais acolhedor e confortável, tornando as visitas ao médico-veterinário menos estressantes tanto para os felinos quanto para seus tutores, proporcionando uma experiência mais positiva e eficaz para todos os envolvidos.
Dentro das orientações do programa Cat Friendly, é essencial que os tutores participem ativamente do manejo adequado de seus animais de estimação antes e depois das consultas veterinárias, pois trata-se de uma espécie extremamente sensível a ambientes desconhecidos, o que pode levar à inibição de comportamentos naturais, além do surgimento de emoções negativas (reforço frequentemente ligado às clínicas veterinárias). Essa colaboração é crucial para assegurar o bem-estar e o sucesso dos atendimentos veterinários.
O gato é uma espécie animal que gosta de rotina, portanto, qualquer mudança repentina no dia a dia dele, pode ser um fator importante de estresse (horários, mudança de alimentação, casa etc.). Assim, este é um dos motivos importantes pelo qual devemos iniciar a preparação da ida à clínica veterinária com antecedência.
ODORES TRANQUILIZANTES
O uso de itens com cheiros familiares, como cobertores, roupas, brinquedos e petiscos, ajudam a acalmar o animal de estimação.
Substâncias atrativas aos felinos, como a erva-do-gato (Nepeta cataria ou catnip), que ajudam a relaxar o pet, e o uso de um spray de feromônio facial felino sintético (FFP) na caixa, pelo menos 30 minutos antes do transporte, também podem ajudar a acalmar o animal. São recursos extremamente úteis para criar uma associação positiva e reduzir o estresse durante o transporte.

Figura 1: desensibilização e condicionamento do gato com a caixa de transporte
CAIXA DE TRANSPORTE
A dificuldade de colocar o gato dentro da caixa de transporte, é um dos fatores que pode desencorajar os tutores a levar seus animais para avaliações. Para facilitar isso, os gatos devem se acostumar como transporte. Recomenda-se passeios curtos de carro regularmente, preferencialmente desde filhotes, auxiliando no processo de adaptação, tornando a experiência menos estressante quando necessária.
A caixa de transporte deve ser introduzida desde o início, sendo colocada em um ambiente da casa onde o gato tenha acesso constante para entrar e sair (figura 1).

Figura 2: modelo de caixa de transporte aberta com o paciente dentro, para avaliação
As caixas de transporte são fundamentais para levar os gatos ao veterinário, em viagens ou durante mudanças de residência, garantindo um ambiente seguro durante o deslocamento e merecendo atenção especial no momento de se escolher um modelo mais adequado. É importante que essas caixas sejam robustas, seguras, estáveis, fáceis de manusear e silenciosas, de modo a não causar medo nos gatos. O design deve permitir uma remoção fácil do animal ou, quando necessário, possibilitar a realização de exames enquanto o gato ainda estiver dentro da caixa (figura 2). A inclusão de uma tampa removível é especialmente útil para gatos mais assustados, agressivos devido ao medo, ou com problemas de saúde, dor ou mobilidade reduzida.

Figura 3: caixa de transporte acoplada ao cinto de segurança durante o trajeto
Durante o trajeto até a clínica, é ideal fixar a caixa de transporte com o cinto de segurança, tanto para evitar acidentes quanto para minimizar o desconforto do animal em razão dos movimentos do veículo. É recomendável cobrir a transportadora com uma toalha para reduzir a estimulação visual e criar um ambiente mais calmo para o gato, evitando a cinetose (enjoo por movimento) (figura 3).
Embora essas orientações pareçam simples, a importância delas é inegável. Ao adotar essas práticas básicas, os tutores contribuem significativamente para um atendimento veterinário mais eficiente e harmonioso, resultando em um ciclo virtuoso, onde o paciente felino recebe os cuidados adequados, os profissionais trabalham com mais segurança e os tutores se sentem mais confiantes e satisfeitos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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Agradecemos a colaboração:

PROFª DRª DENISE TAVARES
Médica Veterinária- CRMV-SP 16.526
Mestrado em Cirurgia Veterinária – FCAV/UNESP – Jaboticabal,(2009);
Doutorado em Reprodução Animal pela mesma instituição(2015);
Docente na Universidade Paulista – Unip – Campus de Bauru desde 2016

CAROLINA BARILLI AFFONSO
Médica Veterinária inscrita no CRMV/SP;
Bacharel em Medicina Veterinária: Universidade Paulista (Unip), 2020;
Pós-graduação em Clínica Médica de Felinos: Equalis, 2023