A causa da ansiedade em gatos é multifatorial e exige mudança de manejo para restaurar o conforto e bem-estar do pet

Infelizmente, temos tido cada vez mais casos de ansiedade nos nossos gatos e, por outro lado, felizmente, ela vem sendo cada vez mais identificada e tratada. A ansiedade é um incômodo, um desconforto emocional e deve receber a atenção devida. Doenças e desconfortos emocionais como o estresse e a ociosidade podem desencadear baixa de imunidade e consequentes doenças físicas diversas. Portanto, o ideal é ter sempre uma boa conversa com um profissional de comportamento felino para melhoras contínuas no ambiente do gato, aliada a consultas periódicas com o médico-veterinário. Saúde não é só física, mas emocional também.
A causa da ansiedade em gatos é multifatorial e pode não ser a mesma para todos os gatos. O que causa ansiedade em um gato, pode não causar em outro, apesar de a maioria dos fatores listados a seguir, serem comuns em gatos:
• Brincadeira com laser: aquela em que o gato apenas persegue a presa, mas nunca caça. Já temos artigos científicos comprovando os malefícios desse tipo de brinquedo que facilmente traz um sentimento de frustração e até agressividade no gato, que fica ansioso por nunca pegar uma presa. Por isso, não recomendamos as brincadeiras com laser.
• Comida fracionada: com exceção de gatos que estão passando por algum tratamento e precisam se alimentar em horários específicos por conta de medicação, na natureza, o gato é uma espécie que faz várias refeições ao longo de 24h. Portanto, se o seu gato é saudável, o mais recomendado é que ele tenha o alimento à vontade, oferecido também em comedouros lentos (comedouros em quebra-cabeças, bolinhas que soltam ração ou puzzle feeders). A situação se agrava quando temos vários gatos na mesma casa, pois a prática do fracionamento pode gerar a sensação de escassez de recurso, levando a um aumento de agressividade e brigas entre gatos, além da ansiedade na hora de comer, o que geralmente faz o gato regurgitar a ração (“vomitar” logo depois de comer).
• Previsibilidade X horários fixos X rotina: quando descobrimos que os gatos preferem ter previsibilidade de ações no território, começamos a acreditar que os horários das atividades deveriam ser fixos. E quando essa rotina passa a não ser cumprida, vem o estresse e, consequentemente, a ansiedade. Já a rotina é quando o gato mora na mesma casa, com as mesmas pessoas e tem seus recursos em locais definidos. Portanto, o ideal é variarmos horários de brincadeiras e sachê, por exemplo, para que não haja condicionamento de horários por parte do gato.
• Poucos recursos X espaço X quantidade de gatos e relação entre eles: em casas com mais de dois gatos, é necessário mapear todas as relações entre os gatos para que possamos espalhar os recursos de maneira que não haja disputa. Ou seja, é preciso ter vários pontos de alimentação (colocados sempre longe dos pontos de hidratação e opostos aos pontos de banheiro). O ideal, até mesmo em uma casa pequena, é ter no mínimo dois pontos de alimentação distintos e dois pontos de banheiro em locais opostos da casa, para que um gato não encontre aquele outro gato que não tem muita amizade. Não raro, o gato mais medroso passa a comer menos e até para de usar um dos pontos de banheiro só para não encontrar o outro gato. Ele passa a ficar tenso no próprio território, ficando ansioso.
• Comida e água no mesmo cômodo que a caixa sanitária: o famoso “quarto do gato” que muitos gateiros gostam de fazer é um problema. Ele consisite em um único cômodo com todos os recursos do gato juntos e próximos: caixa sanitária, comida, água, cama e arranhador. Este espaço é montado para que o felino tenha seu próprio cantinho, mas a questão é simples: ninguém dorme no mesmo ambiente em que defeca e urina. E isso causa forte ansiedade e estresse no gato, pois ele não tem opção! É obrigado a defecar e urinar no mesmo cômodo em que come. Portanto xixis e cocôs fora da caixa, além de sinais de possível doença física, podem ser sinais de ansiedade extrema por conta deste ambiente único.
• Mudanças constantes: sejam elas de casa, reformas, troca de móveis, chegada de um bebê na casa (quando não planejado o manejo para o gato com antecedência), novo morador na casa, óbito de um tutor querido, mudança de rotina e horários da família, todas essas situações podem desencadear frustração, tensão, tristeza e ansiedade nos gatos.

Se o seu gato é saudável, o mais recomendado é que ele tenha o alimento à vontade
SINAIS DE ANSIEDADE
Muitas vezes os sinais são sutis e, outras vezes, não muito claros, como a vocalização em excesso ou fora de um padrão. Sabemos que algumas raças são mais propensas à vocalização como o Siamês. Essa raça tem gatos mais conversadores, o que até pode dificultar a identificação de um quadro de ansiedade. Um exemplo que tenho bastante no meu dia adia é o gato que é acostumado a passear de peitoral sempre no mesmo horário e, em um dia específico, seu tutor não consegue sair com ele. Grandes chances de termos um gato inquieto, miando bastante e até derrubando objetos para chamar a atenção. Esse é um sinal forte de ansiedade causado por frustração. Uma rotina que foi estabelecida, um gato que foi condicionado a uma atividade diária em um horário específico e que passou a não ser mais cumprida.
Gatos filhotes que mamam em si mesmos e em outros gatos, também é um sinal de ansiedade. Geralmente são filhotes que foram separados das mães antes de 90 dias ou filhotes ociosos que não têm uma rotina diária de brincadeiras estabelecida. O ideal nesse caso é procurar um profissional de comportamento para replanejar a rotina de atividades do gato e procurar um médico-veterinário especializado, pois nem sempre esse comportamento cessa sozinho, mesmo com o gato entrando na idade adulta.
O ato de arrancar o próprio pelo pode estar ligado à ansiedade e estresse extremos. Nesse caso, o gato também precisa de ajuda clínica de um médico-veterinário, além do rearranjo do ambiente e modificação da rotina dele.
Outro sinal é a inquietação, gato que parece estar “procurando” algo, andando sem rumo ou gato derrubando objetos. Mas atenção! Esses sinais isolados não podem ser interpretados como ansiedade. A ansiedade é algo complexo e deve ser identificada junto a um profissional de comportamento felino e médico-veterinário especializado em medicina felina ou medicina comportamental.
O QUE FAZER?
Se perceber algum ou alguns destes sinais em seu gato, o primeiro passo é ter certeza de que o gato está saudável, frequentando o médico-veterinário no mínimo duas vezes ao ano. Com a certeza de que o gatinho está saudável, a segunda medida é mantê-lo em atividade, procurando um profissional de comportamento para direcionamento e prováveis mudanças no ambiente e rotinas da sua casa.
PREVENÇÃO
A principal prevenção é sempre manter a saúde do gato em dia e não levar o seu gatinho de estimação ao médico-veterinário apenas uma vez ao ano para vacinas. Os médicos-veterinários sugerem mais visitas ao ano, principalmente para gatinhos com mais de 7 anos. Em segundo lugar, observar a natureza do gato: um caçador precisa estar em atividade, portanto, brincar! Ter quebra-cabeças espalhados pela casa, brinquedos seguros. Dessa forma, ele não brinca só com você, mas também tem atividades cognitivas para executar sozinho. Estabeleça uma rotina diária de atividades e brincadeiras com seu gato para que ele estreite a relação com você. Encher a casa de prateleiras não é rotina de atividades! Um gato sempre precisa ser estimulado.
No início dos anos 2000, os gatos foram apresentados aos tutores como o pet do século XXI porque não precisaria de atividades como um cão, mas não é bem assim… Também é preciso evitar locais pequenos com muitos gatos e pouca gatificação, comida fracionada da forma errada (consulte profissionais!), evitar horários fixos para sachê e brincadeiras. Caso esteja oferecendo lar temporário para uma mamãe e seus bebês, não os separe antes dos 90 dias de vida.
Agradecemos
Valéria Zukauskas, Bióloga, Consultora Comportamental de Felinos Domésticos, Terapeuta Integrativa de pets e de seus tutores, Terapeuta Floral, Comunicadora Intuitiva, palestrante e mentora de negócios pet. Trabalha com comportamento desde 2001 e exclusivamente com felinos desde 2005. Foi sócia do Clube Brasileiro do Gato por 10 anos e lá também atuou como expositora e auxiliar de julgamento de todas as categorias. Tem mais de 6 mil gatos atendidos em consultas comportamentais e mais de 250 profissionais formados em 4 países.
Instagram: @gatosnodiva